sábado, 19 de fevereiro de 2011

Contexto brasileiro atual

Durante a ditadura militar, o Brasil teve um grande período de estruturação industrial, na tentativa de atender a uma demanda interna crescente, sair da estratégia econômica da substituição das importações e também se inserir definitivamente no cenário econômico mundial como um país em desenvolvimento. Foi um período de forte repressão política com total ausência de democracia, proibições diversas, como, por exemplo, o livre direito de expressão.

Em 1984, os militares, depois de vinte anos, deixam o poder para um governo civil. A eleição de Tancredo Neves de forma indireta, por um colégio eleitoral, representou a grande nova esperança para toda uma nação que tanto desejava um país livre e democrático. Esse tempo chegou. Porém, o país não havia se preparado a altura e de forma capaz para atender a uma nova realidade de demanda econômica e social. Não tínhamos uma capacidade produtiva para atender à nova onda de consumo. Entramos, portanto, na era da especulação onde eram mínimas as iniciativas para a produtividade, para o empreendedorismo e maior eram as tentações ilusórias a se investir em fundos financeiros. Foi o tempo dos “open e overs” da vida. Durante esse período, no campo político, o povo brasileiro vivia a alegria eufórica de poder participar dos processos eleitorais em todas as esferas. No campo econômico, sucessivos planos fracassavam, um atrás do outro.

Finalmente em 1994, o governo Itamar Franco, através do seu ministro da economia Fernando Henrique Cardoso, lança o plano real que debelou a inflação, estabilizou a economia, acabando com a especulação e incentivando o empreendedorismo e à produtividade. Em função do sucesso do plano real, Fernando Henrique foi eleito Presidente da República e teve como maior missão o desafio de modernizar o país e prepará-lo para o século vinte e um. Fernando Henrique Cardoso foi presidente por dois mandatos consecutivos (de 1995 a 1998 e de 1999 a 2002). Suas principais marcas foram a consolidação do Plano Real, a introdução do programas de transferência de renda como o Bolsa Escola, além de profundas reformas econômicas que produzem efeitos positivos até os dias de hoje. O governo FHC teve pulso firme para impedir que o Brasil quebrasse, como aconteceu com a Argentina, consolidou a estabilização da economia, derrotou a inflação e melhorou áreas de infra-estrutura do país com as privatizações, em especial o setor de telecomunicações, que recebeu investimentos de aproximadamente 135 bilhões de reais e se modernizou rapidamente nas mãos da iniciativa privada fazendo com que uma linha telefônica deixasse de ser um artigo de luxo, como era até os anos 90.

Em 2002, a eleição do sindicalista Luís Inácio Lula da Silva representou um marco para a história política do Brasil. Lula, também, governou o Brasil por dois mandatos consecutivos de 2003 a 2006 e de 2007 a 2010. O seu governo caracterizou-se pela baixa inflação, redução do desemprego e constantes recordes da balança comercial. Promoveu o incentivo às exportações, à diversificação dos investimentos feitos pelo BNDES, estimulou o micro-crédito e ampliou os investimentos na agricultura familiar através do PRONAF (Programa Nacional da Agricultura Familiar). Na gestão do presidente Lula observou-se o recorde na produção da indústria automobilística, em 2005 e o maior crescimento real do salário mínimo, resultando na recuperação do poder de compra dessa parte da população. Também houve o refortalecimento da Petrobras, que culminou com o renascimento da indústria naval brasileira, que em 2009 passou a ser a sexta maior do mundo.

Temos, hoje, um país moderno, sob a dimensão tecnológica, atrativo para o grande capital especulativo graças a nossa taxa de juros, a maior do planeta, dotado de um parque industrial invejável e, cada vez mais, preparado para enfrentar os grandes desafios da globalização. Porém, ainda continuamos sendo um grande país de grandes contrastes. Inadimissível, diante da nossa situação econômica, sermos um país classificado em 57º lugar conforme o Pizza 2010 (levando em conta as escolas públicas e particulares juntas. Se separar...); índices de violência cada vez mais elevados; total fracasso da nossa segurança pública, falência múltipla da nossa saúde pública; sistema prisional totalmente falido, etc. Tudo isso sem falar do pior de todos os males que nos afligem: a corrupção. É preciso dissociar o Brasil econômico do país carente de desenvolvimento social. Haja vista a China, segunda potência econômica mundial que ocupa o 89º lugar nesse aspecto. Economicamente, estamos indo bem. Socialmente, infelizmente, ainda continuamos sendo um país muito atrasado. Entre os sete maiores países latino-americanos, que somam 80% da população da América Latina e Caribe, o poder de compra da renda per capta do Brasil é inferior ao do Chile, Argentina, Venezuela, México, e Colômbia (apenas superior ao do Peru). O gasto total em saúde no Brasil por habitante é também um dos mais baixos entre os países citados, menor que a metade do gasto da Argentina e do Chile. O Brasil, além da baixa renda e do baixo gasto total em saúde por habitante, destaca-se ainda como um dos países com pior distribuição de renda no mundo.

O Brasil vive um grave processo de despolitização da sociedade e de desmobilização dos movimentos sociais. A população empobrecida, animada pelo auxílio assistencial que está recebendo, vê no governo seu salvador. Algumas centrais sindicais, outrora combativas, foram cooptadas pelo governo (cargos, recursos); alguns setores de movimentos sociais, críticos a esse modelo, receiam criticar o governo para não reforçar a campanha de setores da direita, também interessados em enfraquecer o governo. E o governo desenvolve uma bem sucedida campanha de propaganda para se afirmar como defensor dos pobres, ao mesmo tempo em que defende efetivamente os interesses dos “banqueiros, usineiros e empreiteiros”. O resultado é a desarticulação e a divisão em parte dos movimentos.

O Estado de bem estar social que garanta minimamente a dignidade de que o povo brasileiro tanto necessita como saúde, educação, moradia, segurança, transporte, etc, ou seja, políticas de interesse público com qualidade, somente poderá acontecer se o país, ou melhor, os políticos, nossos representantes, tiverem a vergonha e a coragem de fazerem as reformas cruciais para as verdadeiras transformações: a reforma política, a mãe de todas as reformas; a reforma tributária, pois não se justifica um país onde os pobres pagam mais impostos que os ricos; a reforma da previdência; a reforma penal e outras igualmente necessárias para tornar o Brasil um país justo e solidário e assim, finalmente, deixar de ser o país do futuro para se tornar o PAÍS do presente. Essas ações somente acontecerão com a iniciativa e a força do governo envolvendo a sociedade organizada. Do contrário, continuaremos sendo o país do engodo, da esperteza, do marketing, da mentira, da omissão (agora voltando a ser o país do assistencialismo), da falta da construção do conhecimento e da venda absurda de facilidades para uma vida difícil.

Para, verdadeiramente, ser um país de todos, o Brail precisa deixar de ser o país de uns.